Avançar para o conteúdo principal

📝 Sexta-feira, 21 de Outubro de 2022 - Intern. dia 15


    Sexta-feira, dia de ver a minha médica. A diarreia não estava melhor e as minhas noites cada vez piores. A Enfermeira Ju (nome fictício) pediu à auxiliar Maria (nome fictício) que me ajudasse a tomar banho pois tinha de me pôr pronta que os médicos vinham cheios de ideias da reunião. E assim foi: novo cateter central (de curta duração - 4 a 6 semanas) e alimentação parentérica (intravenosa), sem direito a sequer ingerir água. Por um lado, agradecia porque das últimas vezes que fui à casa de banho já só dizia que nunca mais queria comer/beber. Já estava com dieta obstipante há cerca de 2 dias, mas não foi suficiente. Quando saíram do meu quarto, chorei um bocado (um choro relaxado e não aflitivo como o daquela noite) porque ia voltar à sala de intervenções. Depois dormi um bocado e, quando me chamaram, lá fui eu, mentalizada, e fui a alma daquela festa 🙂
    Pus este novo cateter com o médico que me tirou o primeiro, com a Enfermeira Ju e com um dos médicos que estava presente nas urgências quando soube do meu diagnóstico. Meti conversa com todos, "gozei" com a versão que viram de mim naquela noite e pus a malta a rir-se. Claro que, como sempre, pedi aquela mãozinha amiga que me foi dada! A Enfermeira Ju ainda me fez festinhas na perna, e disse que não se lembrava de tocar num músculo assim! Ahahah na altura ainda tinha algum músculo nas pernas... Imaginem se tinha tocado logo no início 😄
    Foi a Mana que me visitou nesse dia e esteve a massajar-me os pés a ver se desinchavam. A AP (alimentação parentérica - intravenosa) nesse dia era rissóis e húngaros! Clarooooo... Nos dias seguintes ainda continuei a escrever no saco a ementa do dia, mas depois deixei-me disso, já não tinha tanta piada 🙂
    Ainda estava com diarreia e estes foram, sem dúvida, os piores dias até então, pois a combinação de sintomas era estrondosa e deitou-me realmente abaixo (febre, dores inimagináveis no cateter e diarreia). Na prática, isto traduzia-se em ir a correr para a casa de banho a tremer por todos os lados e, ao levantar-me da cama, apesar de todos os malabarismos, não tinha como não fazer força no peito e no pescoço, o que activava ao máximo as dores nessa zona. O simples facto de ter de abrir e fechar a porta da casa de banho para ter alguma privacidade, caso alguém entrasse no quarto, tinha um custo: mais dor porque a porta ainda era pesada e mais tempo que demorava a chegar à sanita o que era suficiente para me sujar algumas vezes. Ainda me falaram na possibilidade de me algaliarem porque a urina que pesavam (sim, tinha de usar uma cadeira-sanita para fazerem as pesagens) nem sempre era satisfatória, dada a quantidade de líquidos que ingeria. Não me fazia sentido nenhum aquilo. Apesar de estar com retenção de líquidos, com o peso a aumentar a olhos vistos e inchadíssima (julguei até que ia ter de pedir as sapatilhas ao meu pai para poder sair daqui), a algália ia resolver a questão do controlo das pesagens segundo me explicaram, mas na verdade o que eu precisava era de diuréticos para expulsar os líquidos. Eu conseguia levantar-me para ir à casa de banho e mesmo que não conseguisse, perante tal cenário, nem que fosse a rastejar, ia! Tudo menos a algália! Vi mais uma vez a minha veia de médica de bancada a enfurecer, bati o pé perante tal possibilidade e a verdade é que com os diuréticos chegámos ao objectivo. Foi sem dúvida uma das fases de maior degredo esta. Ainda bem que questionei porque no meio de tudo o que já estava a acontecer, não tinha de passar por mais esse desconforto. Assim como o de ter a cadeira-sanita no meio do quarto. Qualquer pessoa que passasse pelo quarto e olhasse pela porta via tudo, por isso assim que consegui fui eu mesma devolvê-la à casa de banho.
    

Comentários

Mensagens populares deste blogue

📝 Sábado, 17 de Agosto de 2024

     Uma vida que se pode chamar de louca. Não o "louca" de outros tempos, mas o "louca" destes. Que gosto dá celebrar assim a vida, vivendo-a com todas e tantas ferramentas que tenho à minha disposição hoje. Não "todas" as de outros tempos, mas "todas" as destes.     Depois de dias que, de tão preenchidos e corridos que foram, se tornaram semanas e até mesmo meses sem vir aqui ao meu querido caderno, hoje, a 17 de Agosto de 2024, não consegui terminar o dia sem expressar em palavras todas as imagens que me têm vindo à cabeça relativas a este último ano. Foi há um ano o dia em que saí, por fim, do internamento de 45 dias em que fiz o Transplante de Medula Óssea a que sempre chamei de "pior fase da minha vida", em que me encontrei despida de tudo o que me caracterizava, onde deixei de ser a que também nos dava força a nós - aqueles a quem esta maldita doença e tudo o que ela acarreta tocou: eu, a minha família, os meus amigos e os meus p...

📝 Sábado, 10 de Agosto de 2024

    E não há dias de folga. Todos os dias temos de monitorizar a variação de sintomas já existentes, aparecimento de novos, encontrar padrões e possíveis justificações. Um verdadeiro scan ao corpo inteiro. É cansativo, absorvente, enclausurante, obsessivo e sufocante. Não fazê-lo pode provocar um sentimento de culpa enorme. Como se não estivéssemos a fazer tudo o que está ao nosso alcance pela nossa saúde. Como se não tivéssemos amor próprio. Ninguém o pode fazer por nós e, para contribuirmos para a decisão clínica e por vezes por receio de uma desvalorização das queixas ou de ouvirmos um "isso não é psicológico?" dito das mais variadas e eufemizadas formas, temos de reunir todos estes dados e argumentos e ser os nossos melhores advogados. Percebo o lado do profissional de saúde que tenta despistar uma possível sobrevalorização de sintomas nossa, por outros eventos da vida ou gestão de expectativas que nos possam fazer ter menos tolerância à dor/desconforto/limitação e, nesse...

📝 Sábado, 7 de Outubro de 2023 - 1 ano (parte 3)

  Outubro de 2022 - Semana do diagnóstico     Foi a 2 de Outubro (Domingo), a subir uma rua na Foz, que todos estes sintomas passaram a conversa séria. O meu pai dava-me um avanço de 20 metros pelo menos e, na brincadeira, disse-lhe que eu é que estava com péssima forma física. Ele não ficou convencido e perguntou-me o que eu sentia. Ao enumerar os sintomas, alarmado, disse que eu tinha de marcar uma consulta urgentemente. Perita em desvalorizar, disse-lhe que durante a semana tratava disso, pois até já estava na altura de fazer as análises anuais. Nos dias que se seguiram, acabei por não dar a devida prioridade ao assunto, refugiando-me na indecisão de a que médico/especialidade deveria ir.     Uma vez que ia ficar pelo Porto, queria ir a um Congresso de Salsa que ia haver no fim-de-semana seguinte (8 e 9 de Outubro) mas preocupava-me sentir que não conseguia dançar uma música completa sem cair para o lado a qualquer momento. E eis que na quart...