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📝 Terça-feira, 15 de Novembro de 2022 – Casa dia 2


    Bom diaaaa 😊 Que bom é estar em casa. Não é a minha, mas é casa. Casa é onde temos amor, família, alegria, carinho, pessoas ou animais que nos querem bem, muito pêlo de cão (no meu caso) ou simplesmente o local que tanto batalhamos para ter – o nosso espaço, o nosso abrigo, o nosso porto seguro.
    Sim, é verdade, ontem foi o tão inesperado dia da minha alta. Sair dali foi uma vitória, uma das muitas que terei e mais uma entre tantas que tive. Há que celebrar cada pequeno passo.
   Mal saí, fui com a minha irmã e cunhado à minha casa buscar alguma roupa. E que nostalgia senti ao passar naquelas ruas, ao ouvir o pisar dos meus pés no chão da minha casa e ver como tudo ficou desde que saí de lá naquele fim de tarde de 7 de Outubro. A roupa que ainda decidi apanhar do estendal antes de ir embora ainda estava onde a deixei. Foi uma visita de médico, mas, desta vez, minha. Ainda tentei encontrar alguns vizinhos para explicar o porquê da minha ausência. Vivo num sítio que, apesar de não ser aldeia, é o que mais parece por, admiravelmente, os vizinhos se relacionarem e promoverem alguma entreajuda. Queria muito dizer o que ficou por dizer naquele fim de tarde a um deles com quem me cruzei e a quem avisei que ia estar ausente e que as meninas iam para a casa de férias (a da minha irmã). Nesse momento, ele despediu-se de mim com um “Boas Férias!” e eu estive a um suspiro mais de lhe dizer que não era bem férias o que me esperava. Absolutamente crente de que no máximo em dois dias teria a coisa resolvida e estaria de volta, decidi não lhe dizer que estava a caminho do IPO para fazer uma transfusão de sangue que iria curar a minha anemia. Nunca contei aqui como soube e todo o caminho que percorri, mas um dia conto, com todos os pormenores que valem muito a pena se quisermos ver a parte cómica da situação devido à minha ingenuidade, inocência, incapacidade de ver o pior cenário, recusa em ver o pior cenário ou até mesmo desvalorização das situações inderrotável. Não sei ainda do que se tratou e não sei se algum dia saberei. Mas é uma longa história digna de série pontuada com no mínimo 8.5 no IMDB e classificada como comédia e suspense, pois por várias vezes esbarrei com a verdade, mas resolvi acreditar que era uma questão bem mais simples de ser tratada. Do ponto de vista do espectador, isto deve traduzir-se em estar no sofá com pipocas num misto de risos e juízos sob a forma de diálogos ou monólogos, preenchidos por questões e afirmações como “Ela ainda não percebeu?”, “É óbvio que não é só uma transfusão!” ou ainda “Abre os olhos miúda! Não vês que te mandaram para o IPO e te disseram que tinhas mais qualquer coisa no sangue, ainda que tratável?”. Mas deixemos isto para outras núpcias!
    Seguiu-se o reencontro com os meus sobrinhos mais novos. Estava no carro quando avistei o meu cunhado de mão dada com o pequenino… E, sem sequer me lembrar de vestir o casaco ou dar tempo ao meu cunhado de lhe dizer quem estava no carro à espera, saí a correr e peguei nele ao colo. Fui tão rápida que ele nem percebeu quem estava a tentar raptá-lo. Por isso e pela máscara que estava a usar. O inevitável aconteceu: tive de lhe explicar que estava a chorar porque estava feliz e tinha muitas saudades dele, enquanto baixava a máscara para lhe mostrar que era a Titi dele ❤️ Depois fomos buscar a pequenita e ao longe ainda consegui ver a minha mãe (que estava adoentada).
    Ao aproximarmo-nos da casa deles, onde estou durante esta semana, comecei a ficar nervosa. A minha chegada tinha sido cirurgicamente planeada por causa dos cães. Para além de possivelmente terem força para quase me derrubar, com o nível de plaquetas que tinha qualquer toquezinho podia transformar-se num grande hematoma difícil de desvanecer. E, por estes motivos, esperei na garagem que viessem com trela. O momento por que tanto ansiei aconteceu por fim. Abracei-as, disse-lhes que não as abandonei e que a Mamã delas estava ali.  Os 3 canídeos não me largavam. Foi, claro, muito emocionante ❤️ Ajudei a dar a comida aos pequeninos, não sem antes ir com a minha sobrinha fazer o nosso tão importante ritual: irmos ver-nos ao espelho para vermos o quão lindas nós somos, o quão lindas nós estamos, com ou sem cabelo ❤️ Para este jantar de boas-vindas, pedi bife com batatas fritas e molhos :D No fim, fomos arranjar o meu quarto e a Mana estava a fazer a cama de uma forma demasiado perfeccionista para aqueles que são os nossos critérios (zero exigentes). Disse-lhe que não era preciso tanto e ela respondeu: “Deixa-me mimar-te e fazer alguma coisa por ti”. De seguida disse-lhe: “Vê-se mesmo que não tens cancro.”. Ela paralisou por uns segundos e percebi que foi demasiado forte. Estou há quase 40 dias a viver com isto, por isso já trato a doença por tu e não tenho problemas em dizer o seu nome. Mas claro que nem toda a gente consegue lidar da mesma forma.

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